domingo, 7 de julho de 2013

Razão e Deus 3

Deus criando os animais, afresco de Vittskövle Church.

Texto produzido em parceria com meu pai.


Aos imaginários seres sobrenaturais vimos que compartilham conosco os mesmos princípios, a vida e a razão. Nossos corpos degradam-se no tempo, o qual, em tese, não os afeta, pois os imaginamos imunes à morte e dotados de corpos incorrupitiveis, de saúde à toda prova e inteligências superiores à nossa, enfim de toda excelência que à que se possa aspirar.
            Excetua-se à este paralelismo, a matéria de que é feita o seu habitat, que  em tese não pode ser a mesma que a do nosso. Citamos por exemplo, o fogo à que nada no nosso habitat resiste, razão porque desde sempre foi-lhe atribuído procedência sobrenatural e divina e perante o qual, pela intensa atração e aterradora repulsão, no homem suscita o sentimento do sagrado, o mesmo que usa para relacionar-se com o divino e as divindades que compartilham conosco a vida e a razão, são seres viventes e racionais.
            Uma pedra contém em si a sua razão de ser, da qual todavia não tem conhecimento racional, mesmo que intuitivo, atribuição que só aos seres viventes se pode dar, qual seja o conhecimento de si perante o mundo; mundo que é racional e conhecimento que só o pode ser também, ainda que intuitivo.
            Ainda que a razão se manifeste em tudo que se conheça, não o faz no Caos; no Caos as ocorrências se dão incausadamente, fenômeno inacessível à razão. A própria razão como essência que é, busca para si uma causa; a este principio na base da razão chamamos Ser. O Ser é a essência de todas as essências, e como tal está presente  em toda parte inclusive no Caos, região da incausalidade e ausência da razão. A razão por sua vez está presente na região do universo chamado Cosmos, enquanto que a vida só se manifesta em regiões especiais desta; assim, uma essência dando base à outra, camada por camada, começando pelo Ser, a razão, a vida, até chegar àquela que se manifesta tão somente no indivíduo.
            Para podermos avançar, precisamos definir o conceito de existência- o que é existir? Será o mesmo que Ser? Devemos discernir esses dois conceitos para continuarmos a nossa busca. Uma pedra é o que é- todos tem em si o Ser, todos são o que são- mas nem todos existem?! Existir é uma coisa e Ser é outra? Uma pedra só passa a existir a partir da consciência que o aborde cognitivamente. Para a cobra que busca um refugio, a pedra deixa de ser o que é, para tornar-se uma pedra para a cobra conhecer e nela agir; a cobra por sua vez tem, ainda que intuitivamente, um conhecimento de si perante a pedra; a cobra não somente é o que é, mas como objeto de conhecimento, passa também a existir para si perante a pedra. À este conceito de existência se aplica à nossa cognição de Deus, mas vamos avançar um pouco mais antes de indagar se Ele existe ou não e o que isto quer dizer; vamos ver que relação tem o Ser com Deus.
            Os objetos ainda que diferentes em suas formas, todos igualmente são, pois manifestam o mesmo principio- o Ser, o principio na base de todas as essências. Para um objeto de conhecimento ser um cachorro é preciso antes que seja um objeto, que independentemente de ser ou não um cachorro, é um ser. Depois disso, é preciso que venha a ser um ser vivente, ou seja, que manifeste em si a vida, para depois vir a ser um animal mamífero e na seqüência da espécie canina, de tal raça e por fim, o individuo que em si contém essa seqüência de essências, começando pelo ser até auqela que o individualiza como um tal cachorro.
            No exemplo do cachorro vimos que o mesmo continha em si a série das essências que o fazem ser o que é. São essências em ato, enquanto que as mesmas se encontram em potencia no Ser primordial. Exemplificando: no ovo fertilizado, se encontra a ave em potência- em cada ave, um ovo em ato- na semente está a planta em potencia, na planta está a semente em ato. Este Ser primordial do qual todo o resto depende para ser, contém em si todas as essências, das mais basilares até as mais superficiais. O conceito de Ser primordial se aplica a figura de Deus que a busca por conhecer as origens do homem a partir dos seres sobrenaturais nos levou a conceber, Deus este que em tese é o que é, basta saber agora se além de ser o que é, existe também, ou seja, pode tornar-se objeto de nosso conhecimento e consciência?! E ainda que o conheçamos a nosso modo, se a este conhecimento podemos atribuir o valor de verdade?! Pois Ele é o tipo de objeto que não se nos oferece a observação direta; restando-nos conhece-lo à partir de seus atos, os quais terão que apresentar-se-nos pelas marcas de sua autoria para que racional e não emocionalmente, os entendamos como tais. Para aqueles que conseguem este feito, Deus existe, para os que não conseguem, Deus não existe, sem todavia deixar de Sê-lo para a consciência humana.
            Por último temos que salientar que o conceito de Deus se origina no Ser, aquela essência na base de todas as demais e em cuja base não há mais nada, ou seja, só há o Nada que a razão humana não consegue conceber. O Ser é o Deus dos filósofos, é um Deus imanente ou criador, como se queira chama-lo, mas é um Deus com que (m) o homem não interage, não convive no sentido comum do termo, é um Deus meramente conceitual. Mas deste Deus uno e distante até as divindades que primeiro surgiram na mente do homem há um ponto de encontro onde o Ser e o homem identificam-se Nele. A este Deus, ao Ser humanizado, a este, podemos conhecer porque Nele nos conhecemos a nós e colocamos em ato o que temos em potencia. Este Deus não só existe como também dá sentido e finalidade à nossa existência.









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