Texto produzido em parceria com meu pai.
Biologicamente
somos propensos a ter atração pelo doce e repulsão ao amargo, aqui, no Tibet,
na África ou no Alasca, onde tenhamos nascido seja em que época e cultura, o
será desta forma. As canções de ninar criança são todas ritmicamente suaves com
voz mansa e notas não agudas, aqui, no Tibet, na África ou no Alasca, onde
tenhamos nascido, seja em que época e cultura for. O afago materno é desejável
a todo recém nascido de cuja falta protesta chorando aqui, no Tibet, na África,
ou em qualquer outro lugar e tempo.
As sensações
formam a linguagem natural com que nascemos para interagir com o mundo e
aprender por intuição a elaborar esquemas de ação em fórmulas pré-concebidas
para lidar com as múltiplas situações que a vida se nos oferece a todo
instante; infinitas em número, mas não em gênero, o que propicia classificá-las
em categorias gerais aplicáveis a casos especiais de gênero que a memória
abstrai à partir das semelhanças de cor, sabor, odor, timbre, forma, conteúdo,
volume, utilidade e outras.
A atração e a
aversão com que interagimos naturalmente com o mundo nos ensinam a adotar em
todos os demais níveis da consciência, uma conduta bipolar do sim e do não; as
coisas ou dão gosto e prazer ou desgosto e desprazer, levando-nos a entender
que nos fazem bem ou nos fazem mal. Agindo a partir das consciências psíquica e
intelectual, posicionamo-nos a favor ou contra, com sentimentos de simpatia ou
antipatia. Vemos que o mundo sensível excita as sensações, ou seja, a
consciência sensorial que por sua vez gera na psique os sentimentos e emoções,
instância da consciência com a qual se mantém em permanente dialogo e
correspondência, e cuja linguagem a consciência intelectual codifica e ordena
por símbolos e palavras. As palavras bem e mal, benéfico e maléfico, formam
conceitos que em principio denotam o que o mundo sensível tem a nos oferecer de
agradável ou desagradável. Há todavia em nossas sensações aquela que participa
ou co-participa das demais; se sentimos um cheiro desagradável queremos logo
saber a que objeto corresponde, queremos ver o objeto; se ouvimos um som
estridente queremos saber de onde vem, queremos ver o que o produz. Enfim, a
visão acompanha as demais sensações cumprindo a sua tarefa de retratar para o
intelecto as origens e os objetos a que correspondem; imagens que o intelecto
codifica junto à psique a partir dos sentimentos de simpatia ou antipatia; os
quais deflagram os esquemas de ação para a atração ou repulsão. A estes
sentimentos o intelecto confere nomes como beleza e feiúra, símbolos que
apontam para a consciência o benéfico que devemos dele nos aproximar e o
maléfico do qual devemos nos afastar. O ser humano embora nasça dotado dos
sentimentos básicos como o medo, a raiva, gozo e sofrimento, desenvolve a
partir destes uma infinidade de sentimentos diríamos, humanos, dos quais, os
animais não compartilham: o respeito, a compaixão, a inveja, a cobiça, a
vingança,entre tantos, apresentam uma gama de sentimentos que só se tornam
possíveis através do simbolismo das palavras. O desejável e o indesejável
apontam para o benéfico e o maléfico e por influência da visão que de tudo
procura participar, desembocam para o bonito e o feio; conceitos estes
estéticos que tem o seu nascedouro na vida e na não-vida ou morte, na saúde ou
na não-saúde ou doença, na força e vigor ou na debilidade e fraqueza. O fogo da
lareira é aconchegante e bonito aos olhos, já as chamas dum incêndio são
terríveis de se ver. Como princípio e fim, tudo o que favorece a saúde se torna
conceitualmente bonito e aquilo que a prejudica, feio. Assim dizendo, a
estética se torna uma estrutura conceitual que deflagra os esquemas de ação
movendo-nos na direção daquilo que nos é benéfico da mesma forma que nos afasta
do maléfico.
A estética põe
o individuo perante a vida, a sua própria vida, e a ética o situa perante os
demais humanos com que compartilha a sua vida social. Essas duas instâncias
conceituais formam conjuntamente os dois eixos interativos de toda ação humana.
Os nossos esquemas de ação, via de regra se deflagram após passarem pelo crivo
dos dois que por seus turnos subordinam-se à uma instância superior que os
comanda com os seus valores ideais, instância que chamamos de existencial. Os
sentimentos do sagrado e da adoração por exemplo, pertencem a essa instância
conceitual.
Sacrificar a
própria vida por um ideal por exemplo não se justifica nem estética e nem
eticamente; conduta que só a instância existencial pode provocar fazendo com
que os esquemas de ação contrariamente à sua gênese conspirem contra a própria
vida. A linguagem como mediadora dentre as várias instâncias da consciência,
eleva o homem à estatura de ser singular, de cujo mundo interior estético,
ético e existencial nenhum outro ser que se conheça compartilha. Não é de
estranhar portanto, que o objeto principal da filosofia tem sido e o será
sempre, o Ser.
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