domingo, 7 de julho de 2013

CARTA A UM AMIGO ESPIRITUAL NO SENHOR

DUAS LEITURAS POSSÍVEIS DA PARÁBOLA DO PUBLICANO E DO FARISEU ( Lc 18, 9-14):


(i) sobre a arrogância espiritual (fariseu) e a humildade em reconhecer-se pecador e necessitado da Graça (publicano).


(ii) sobre a relação afetiva/amorosa e a relação jurídica entre Deus e o homem; Graça X Lei; Publicano X Fariseu.

Fariseu e Publicano
Afresco na Abadia de Ottobeuren
Fonte: Wikipedia


      No Evangelho de Lucas 18, 9-14*, Jesus narra a parábola do publicano e do fariseu. Nela, diz-se que os dois subiram ao templo para orar. O fariseu, estando de pé, orava consigo mesmo, afirmando-se e dando graças a Deus por não ser como os demais homens, injustos, ladrões, adúlteros e nem ainda como aquele publicano (referindo-se ao publicano que também entrara no templo). O publicano por sua vez, de longe e cabisbaixo, orava batendo no peito e pedia perdão a Deus por seus muitos pecados. Jesus conclui a parábola dizendo que o publicano descera justificado para sua casa, e não o fariseu; pois qualquer que se exalte será humilhado e qualquer que se humilhe será exaltado.

Amigo espiritual, te digo que o Senhor ao narrar tal parábola, não se preocupava com a veracidade ou falsidade de ambas as orações proferidas. Por certo, o fariseu estava sendo verdadeiro quando dizia não roubar, não adulterar e não ser injusto, assim como o publicano dizia a verdade ao confessar-se pecador. Repito: Tal parábola não trata acerca da verdade ou falsidade das orações proferidas!

A parábola trata de apontar o pecado cometido pelo fariseu por confiar em suas boas obras e da virtude do publicano em reconhece-se pecador e necessitado da graça. Existe aqui, dois movimentos: o primeiro de apontar o pecado da arrogância espiritual e o segundo de revelar a humildade como importantíssima virtude cristã, daquele que reconhece sua miserável condição e sua consequente necessidade do auxílio da graça. E por isto, meu amigo espiritual, te digo que um foi justificado, porque embora tivesse muitíssimos pecados, era capaz de reconhecer sua condição desfavorável e sua permanente necessidade do auxílio da graça e do perdão, enquanto o outro, embora não tivesse muitos pecados, tinha entretanto, um pecado que ofuscava-lhe todas as virtudes –  o pecado da arrogância espiritual.

O arrogante espiritual é aquele que julga não precisar do perdão e do auxílio divinos, achando que suas boas obras bastam diante de Deus. Ao passo que o humilde espiritual é aquele que reconhece sua precariedade e sua permanente necessidade da graça e auxílio divinos e do perdão cotidiano que Deus nos concede. Um, possui um pecado que ofusca todas as suas virtudes, outro, possui uma virtude que ofusca (pela graça) todos os seus pecados.

Portanto, meu amigo espiritual, quando fordes orar, fazes como o publicano, que envergonhado pedia perdão a Deus por seus muitos pecados. Pois para aquele que tem comunhão com Deus, até o pecado o aproxima de Deus (por causa do coração humilde e do reconhecimento da necessidade da graça), ao passo que para aquele que não tem comunhão com Deus, até a virtude e as boas obras o afastam Dele (por julgar-se superior aos demais).

 Outrossim, pode-se ler a mesma parábola  sob outro ponto de vista: O publicano como representante da relação afetivo-amorosa para com Deus, e o fariseu representante da relação jurídica para com Deus. Enquanto o fariseu apresenta ao Senhor suas boas obras correspondentes à justiça divina que "obrigaria" o Senhor a retribuir-lhe com bençãos, o publicano, não tendo como apresentar boas obras, apela para o amor de Deus,  Seu perdão e Sua afetividade.

      Sob este ponto de vista, Jesus quer ensinar de que colocadas lado a lado a relação afetiva e a relação jurídica de Deus para com o homem e vice-versa, ainda que o homem cumprisse toda a lei impreterivelmente, como por exemplo, no caso do fariseu, ainda assim, Deus continua preferindo a relação de proximidade que a afetividade proporciona. Por isto, o publicano desceu do templo exaltado e o fariseu humilhado. Deus escolhe pelo amor ao invés da justiça; pelo afeto ao invés do "toma lá da cá" das responsabilidades e deveres sociais; escolhe pela Graça ao invés da lei; ser chamado de Pai ao invés de credor ou Juiz.

Portanto, meu amigo espiritual, quando fordes orar, fazes como o publicano, que lembrando-se de Deus escolheu chamá-Lo de "Pai",  ou para ser mais coerente com o texto bíblico, escolheu confiar em Seu perdão e amor, ao contrário do fariseu, que lembrando-se de Deus, achegou-se como um credor se achega do devedor, esperando receber a paga.
    



 Paz e Bem,

 José Chadan



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PUBLICANO:                            FARISEU:                                                                              

Graça                                               Lei                                                                                              
Amor                                                Justiça                                                                                                 
Perdão imerecido                      Castigo/recompensa                                          


Deus-pai                                        Deus-juiz                                            



Humildade                                         Arrogância        

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* Cf. BÍBLIA SAGRADA. Trad. João Ferreira de Almeida, Revista e corrigida. 76 ed. Rio de Janeiro: Imprensa Bíblica Brasileira, 1993, 
Luc. 18, 9-14.
       





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