quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Aforismos Diversos

I. " Se você deseja conhecer uma pessoa a fundo repare na profissão dela. Talvez seja um indício de como ela enxerga e se posiciona no mundo:
Um mendigo vê o mundo das margens da sociedade; um militar é disciplinado e inflexível, não poucas vezes, violento; um filósofo tudo investiga por meio do intelecto, tentando perceber os mecanismos internos e externos de toda e qualquer questão, muitas vezes possuindo uma visão peculiar sobre cada questão e se sentindo deslocado do mundo; um médico vê figados e rins, doenças e curas; uma senhora de alta classe vê esmaltes, festas e seu próprio nariz empinado e enrugado; um pastor vê a Cruz e o mistério; um voluntário vê o mundo pelas lentes do altruísmo, e assim por diante.
Dizer que um filósofo pode se relacionar com um mendigo da mesma maneira que se relacionaria com um médico é no mínimo equivocado. Ou dizer que uma senhora da alta classe se relacionaria com a dona da boutique da mesma forma que se relaciona com o pastor, também é um engano. E achar que um compreende o outro daí é escorregar na casca de banana. Sem sombra de dúvida, alguém está mais ou menos próximo de compreender e bem se relacionar conforme sua profissão".

II. "Quem só possui virtudes, não é humano. Está mais próximo dos santos ou dos anjos. Por outro lado, quem só possui vícios também não é humano, estando mais próximo dos monstros ou demônios. Humano é aquele que possui muitos vícios e muitas virtudes (tudo misturado).
Como dizia Lutero: há virtudes que nos afastam de Deus, mas há vícios que nos aproximam Dele com o coração contrito (menciono de cabeça).
O homem que consegue cumprir todos os seus deveres, embora seja uma pessoa reta, por causa do orgulho, não conquista verdadeira intimidade nem com seu próximo, nem com Deus. Pois a todos olha com ar de superioridade.
Já, o homem errante, que peca demasiadamente, mas que por causa da disposição humilde, reconhece seus fracassos, pode conquistar verdadeira intimidade tanto com Deus como com o próximo. Pois se relaciona com todos humilde e equanimemente".

III. " No trabalho o homem deixa de pensar, criar, produzir com 'P' maiúsculo. E, no ócio, na preguiça, ele consegue divagar, dar cores aos sonhos, ter ideias brilhantes. Salvo engano, as grandes ideias que mudaram o curso da história surgiram em momentos de ócio e de preguiça".

IV. "Quem não tem 2/3 de seu tempo livre, é escravo! Pode ser um escravo-proletário, escravo-banqueiro, escravo-magnata. E, quando foi mesmo abolida a escravidão?! (salvo engano, Nietzsche disse a mesma coisa só que com palavras mais pomposas)".

V. Por detrás da ideia de DIGNIDADE DO TRABALHO está a ideia de EXPLORAÇÃO. Mas dela ninguém fala, porque é indigno mencioná-la. A Exploração, esta dama que se esconde nas saias da "dignidade"

VI. AFORISMOS SOBRE O DINHEIRO:
(i) Qual a real diferença entre um banqueiro e um agiota? Que o primeiro é um ladrão mais esperto que se protege mediante as leis e faz acordos com o governo.
(ii) Qual a real diferença entre um assaltante e um mercador (comerciante)? Que o primeiro é mais honesto ao dizer "isso é um assalto!". E, o segundo é mais esperto, pois se protege atrás das leis "justas" da oferta e da procura.
(iii) Logo, o agiota e o assaltante são mais honestos ao dizer o que estão fazendo. E, o banqueiro e o mercador são mais espertos, ao fingir o que NÃO estão fazendo, isto é, roubando e enganando.

VII. IGREJA NÃO É EMPREENDEDORISMO:
"Quanto aos mega-templos, é preciso que se diga: uma mega-igreja jamais será uma comunidade cristã.
Uma comunidade cristã deve ter no máximo 100 membros. Para que todos se conheçam e tornem-se uma família, fortalecendo em Cristo os laços de amor fraterno. Cada um deve conhecer o outro pelo nome, conhecer suas qualidades, virtudes, suas manias e vícios.
Igreja, comunidade cristã, não pode ser empresa. Igreja não combina com empreendedorismo. Igreja é amor, união fraterna, um membro precisa conhecer o outro pelo nome, tomando ciência de suas necessidades e aflições.
A lógica do empreendedorismo não pode ser aplicada à Igreja de Cristo, porque tão logo aplicada, a comunidade alarga suas medidas e deixa de ser comunidade. Torna-se um lugar onde o amor não habita, pois ninguém conhece ninguém pelo nome e a empatia vai se esvaindo do lugar. Quando menos se percebe, o irmão não sabe quem é aquele que está logo ao lado, a orar. E, como orar sem comunhão?
O amor fraterno deu lugar ao dinheiro e a Igreja de Cristo virou um mercado escuso. Se Jesus estivesse entre nós, entraria nos mega-templos com chicote, como fez no templo de Jerusalém.
A lógica do capital jamais será a lógica de Cristo".

VIII. "Quando alguém está doente, deve procurar um médico. Pois nesse caso, procurar qualquer pessoa que não um médico, equivale a cometer equívoco grave. O mesmo ocorre quanto alguém sente-se aflito ou angustiado, devendo procurar um filósofo. Somente o filósofo poderá esclarecer quais os males existenciais que acometem tal pessoa.
Mas, infelizmente, quando pessoas se sentem angustiadas, aflitas ou infelizes, elas buscam uma loja, sapatos da moda, carros e riqueza material. É semelhante ao doente que ao invés de buscar um médico, busca um amigo, que por mais íntimo que seja, não poderá fazer nada senão dar palpites equivocados e quiça, desastrosos".

IX. A SEGURANÇA AO AVESSO
i. Os lugares mais seguros nunca foram as fortificações. More em uma cabana e ninguém quererá assaltá-la. E assim, você encontrará paz.
ii. Tenha um fusca ou um brasília, e não temerá a violência nem a cobiça.
iii. Se quer se sentir protegido e seguro, viva de maneira simples e sem ostentação. Ficará seguro contra toda violência humana.


X. VAGABUNDOS ILUSTRES:
Sócrates: Vivia perambulando pelo centro comercial da cidade grega de Atenas, constatando de que os artigos vendidos por ali, não eram necessários à manutenção da vida. Ficava arguindo os atenienses sobre os mais diversos assuntos, entretendo e deixando-se entreter. Andava com roupas simples e alparcas. Além de ter se casado com uma mulher que só fazia encher o saco e não lhe deixava perambular, conversar e filosofar à vontade. Afinal, de tudo que a cidade proporcionava, ele parecia já estra satisfeito com tão pouco, empregando o resto do tempo e da vida aos assuntos realmente importantes - a filosofia e as questões fundamentais da vida, como por exemplo, tentar definir o que é o amor, a justiça, a amizade e a política.
Diógenes: Consta que possuía apenas uma túnica, um alforge e que se abrigava em um barril. Satisfazendo-se com um único prato de lentilhas por dia. Debochando da complexa sociedade civil, e a hipocrisia que lhe cercava, resolveu sair dela e viver com o estritamente necessário - um barril, um prato de comida por dia, uma túnica e um alforge.
Epicuro: ensinava de que o melhor é ter uma vida de prazer (mas neste caso, prazer quer dizer, moderação). Veja: se alguém come demais ou faz sexo demais, não terá mais prazer, senão que terá desgaste físico e desprazer. A vida prazerosa, ensinava Epicuro, é uma vida onde se possui o necessário e se tem moderação. Comendo só o tanto para ter prazer, conversando com amigos, fazendo sexo e etc, tudo com moderação (porque na des-moderação e no exagero, há sempre o risco de deixarmos o prazer e cairmos no desprazer e desconforto).
Dentre outros sábios...

XI. EM DEFESA DA FAMÍLIA (?):
Quando os membros da bancada evangélica defendem a família, e se colocam contra gays, lésbicas e afins, faz-se necessário explicitar a que modelo de família eles desejam defender: o modelo burguês de família.
O modelo burguês de família pode ser comparado a uma fábrica. O pai é o chefe. Ele mantém tudo e sustenta, mas ele também manda. Lembremos do dito popular: quem paga manda! Não precisa ter muita erudição para saber disso. Então, o pai é o chefe, os filhos e a mulher são parte sua, uma espécie de extensão do chefe. Poderiam ser comparados às máquinas da fábrica, como se fossem sua(s) propriedade(s). Ou, comparados aos empregados que lhe obedecem.
Mas por que digo isto?! Porque o discurso da bancada não o diz, induzindo até mesmo pessoas pobres, proletárias e não-burguesas, a adotarem uma causa que não é a delas. Elas comumente não possuem grana, tampouco bens e estão pouco se lixando pro ideal de família burguês (embora na maioria das vezes, só saibam disso intuitivamente, sem precisar racionalizar um outro discurso).

OUTROS MODELOS DE FAMÍLIA:
1. Nos tempos antigos, a vaca, o cavalo e o burrinho eram membros da família, tamanho o afeto que os humanos sentiam por estes bichinhos. O cavalo não era apenas meio de transporte, senão que possuía nome e era tratado com pessoalidade. A vaca, semelhantemente. Gratos não só por seu leite, mas acalentados por sua companhia. E, com o burrinho, ocorria o mesmo.
2. Na Idade Média, os escravos (apesar de serem escravos) eram membros da família e dormiam no mesmo cômodo de seus senhores. Cuja única divisória era um véu que se fechava por volta de toda a cama.
3. E, hoje, há também diversos modelos de família: homem, mulher, cachorro ou gato. Homem e Homem. Mulher e Mulher. Tias e sobrinhos que vivendo debaixo de um mesmo teto, participam da mesma economia doméstica, dentre muitas outras.
Enfim, todos que co-habitam no mesmo espaço, cada qual com uma função específica, que colaboram para a economia doméstica e estão ligados por laços de afeto, são FAMÍLIA.
DEFENDEMOS TODOS A FAMÍLIA, MAS QUE MODELO DE FAMÍLIA QUEREMOS DEFENDER? UM MODELO PATRIARCAL SAUDÁVEL, DEFENDEREMOS. MAS, SE FOR OPRESSIVO NOS MOLDES DA INDÚSTRIA, MELHOR ESCOLHERMOS OUTROS MODELOS. O DA VAQUINHA, OU OUTRO QUALQUER.
NÃO SE TRATA DE DEFENDER OU NÃO O MODELO BURGUÊS DE FAMÍLIA, MAS DE DEFENDER UMA FAMÍLIA QUE SEJA FUNCIONAL E SADIA, INDEPENDENTEMENTE SE É BURGUESA OU DE OUTRO TIPO.

XII. "Apesar da dificuldade em denominar alguém de cristão, sem precisar perguntar logo na sequência a que tipo de cristianismo ou cristandade tal pessoa pertence, já que existem inúmeras dissidências dentro do cristianismo, EU me professo cristão! Porque creio que apesar das diferenças e divergências, TODOS os cristãos se encontram e comungam, quando ajoelham aos pés da Cruz".

José Chadan

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Caricatura





* Caricatura feita por Armando Marcos. Veja também a página no face: Armando Marcos  caricaturas & ilustrações <https://www.facebook.com/armandomarcoscaricaturas>.

domingo, 3 de agosto de 2014

RELIGIÃO E SIMULACRO

Quando o uso dos símbolos religiosos serve para enriquecer nossa vida interior e quando apenas desvia nossa atenção para a ostentação e o embasbacamento

As igrejas neo-pentecostais, longe de serem autenticas e genuínas manifestações de fé, são simulacros. Muitas vezes a arquitetura simula uma ogiva medieval, ou um altar magnífico. Porém, o que saudosamente se busca, é um cristianismo que outrora, era praticado com verdade e singeleza.

As formas arquitetônicas, não poucas vezes, imitam a arquitetura antiga e medieval, mas não servem para trazer à tona uma fé viva. Tampouco a impressionante retórica do ministro o pode fazer.

As práticas mágicas e de milagres, servem apenas para reforçar que outrora, houve uma chama que se apagou para nós. O cristianismo atual não manifesta uma fé genuína, senão, que é apenas uma imitação e um simulacro daquilo que, quem sabe, um dia foi vivo no coração dos homens.

Cristianismo não se faz com igrejas magnificas, nem com rituais de cura, tampouco com sublevação dos ânimos. É claro que toda religião possui seus símbolos e precisa lançar mão deles. O problema é quando os símbolos já não "funcionam" mais. Se tornaram disfuncionais, pois ao invés de nos conduzirem para uma jornada interior, de auto-reflexão e, de busca espiritual, eles [os símbolos] são usados como meros apetrechos estéticos e de ostentação, com o objetivo único de impressionar.

Os símbolos religiosos, encontrados não só em igrejas, mas em templos budistas, vaishnavas e terreiros de candomblé, servem para a pedagogia espiritual do povo. Servem para ensinar as histórias para aqueles que, não tendo tido oportunidades, não puderam aprender a ler e escrever. É assim que surge, por exemplo, a figura do artesão medieval, para o qual, o pároco fazia diversas encomendas. Basta ir até uma Igreja católica e, mesmo que não se saiba ler, as imagens lhes contarão uma história: de alguém que carregava uma cruz nas costas ou de uma mãe que deu à luz mesmo se mantendo virgem. A estátua de Buda, é antes de tudo, pedagógica, pois ela ensina a todos que olham para ela, o caminho da ataraxia, da paz, e do desapego. E, assim ocorre com os diversos símbolos encontrados nas mais variadas religiões pelo mundo.

Quando um símbolo, como a imagem de um santo, um relicário, uma capela, mesquita, uma cruz ou uma ogiva no meio da nave da igreja, deixam de ter uma função pedagógica, isto é, de ensino (de apontar um caminho para a auto-reflexão, bondade e espiritualidade), então, ele deixa de ser um símbolo genuinamente religioso, com poder de ajudar as pessoas a se tornarem gente, e passa a ser mero enfeite e simulacro de algo que deveria ser espiritual, mas não é (se tornou mera matéria), que deveria ser pedagógico, mas não é (se tornou um objeto que confunde, leva ao entretenimento e não esclarece a pessoa que para ele "apela").


Em suma, eu diria que:


(i) Quando os símbolos (santos, cruz, água benta, e etc) nos conduzem para dentro de nós mesmos, eles estão ajudando-nos em nossa caminhada espiritual. Ajudando-nos a sermos melhores. A nos aproximarmos da Imago Dei (imagem de Deus).

Mas...

(ii) Quando os símbolos religiosos nos conduzem para fora de nós mesmos, apenas causando espanto, terror, embasbacamento, deslumbramento, eles estão na verdade, nos desviando do caminho. Estão tirando nosso foco - nossa busca espiritual de nos assemelharmos da Imago Dei (imagem de Deus).

Soli Deo Gloria,
José Chadan

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

DOS PÍNCAROS DA ABÓBADA CELESTE, EU VI – O POBRE CRISTO


Dos píncaros da abóbada celeste, eu vi
Os carrilhões da igreja de Cristo
Badalando na mesma batida de um coração quebrado
Que a essa altura, não discerne bem os sons

A partir daí, o drama da salvação se fazia, dentro de mim
Sofrendo chacotas ao carregar a cruz ao novo gólgota
A chamada – Caveira
Não mais a da Jerusalém terrestre, senão a do Brasil de hoje

Quando perguntado o povo sobre o condenado
Ele respondeu: José merece ser crucificado
Porém, não aos olhos de todos, mas sem alarde
Para que, não sendo visto, não fosse lembrado

Um tirano lavou as mãos, não foi possível ver-lhe o rosto
Por certo, era político
E o povo aplaudiu todo o cortejo

Deu-se então, a saber, a Via Dolorosa
De muitos Josés, vagabundos, putas e sem-teto
Crucificados às margens da cidade
Em todos eles, a marca de um rosto judiado, cristificado

Dos píncaros da abóbada celeste, eu vi
Os anjos tomando à mão os excluídos
Conduzindo-os à intimidade de seu Senhor
Que ao cumprimentá-los, em tudo se identificou
Mormente pelo calejo nas mãos e semblante caído

Abençoou-os e chamou-lhes felizes
Lembrou-lhes o Sermão do Monte
E da lógica divina que a tudo inverte

Outro anjo, que possuía a chave do livro
O teria aberto, mas não lhe foi permitido
Pois Deus fez as coisas fracas para confundir as fortes
E as loucas, perturbar a estultícia

A essa altura, já não se podia discernir
Se isto seria o delírio produzido pelo vinagre azedo
Ou pela alegria incompreensível de um
Profeta que tudo fez ao avesso

Dos píncaros do céu, eu vi
Os carrilhões da igreja de Cristo
Badalando na mesma velocidade que caminha um mendigo,
Uma puta, ou um sem-teto

Dos píncaros do céu, eu vi
“O Jesus crucificado”
Morador dos guetos, com cachimbos de vidro, qualquer sofredor ou novo leproso
Sem razão aparente, sorrindo –

Apesar de ter na palma das mãos, dois pregos
Que narravam através de cada tragédia pessoal
O drama do Cristo





José Chadan

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

CARTA AOS NOVOS HUMORISTAS BRASILEIROS

Surpresa é um componente do humor - Retirado da Wikipedia , verbete Humour.



 José Chadan



O humor é a faculdade humana capaz de fazer o homem rir – de si mesmo e dos outros. Mas não é um rir no sentido de zombaria, escárnio ou depreciação. Pode ser mesmo um rir em ver-se ridículo, mas nunca em depreciar-se ou depreciar o outro.
            O bom humor, o humor bem feito e de boa qualidade, caracteriza-se sobretudo pela catarse, que compreendida por Aristóteles e por toda a dramaturgia grega, seguia um duplo movimento: (i) rir de si, perceber o quão ridículo somos em determinados momentos e, (ii) ao rir-se, libertar-se e purificar-se de uma certa fixação em parecermos desta ou daquela forma.
O resultado final do bom humor e da catarse, seria, portanto, o alívio das tensões, uma certa leveza, purificação e a aceitação de dadas situações como eventos naturais ou algo que o valha.
Um exemplo de bom humor e catarse, para não nos delongarmos demais, seria: ao ver uma cena cotidiana, onde o homem, todo estabanado, não sabe como se declarar a sua amada (ao vermos tal cena, nos identificamos com o aspecto ridículo da cena, e nos sentimos mais leves, percebendo o quão natural isso é). Ou, contemplamos uma cena de dois amigos embriagados falando besteiras e, ao assistir tal cena, nos enxergamos neles, nos projetamos, sendo capazes de rir deles, mas também de nós mesmos e assim, tornarmo-nos mais leves e críticos em relação ao que nos faz de certa forma, ridículos.
            Contudo, não é isso o que vemos no humor que tem sido feito no Brasil. Não é bom humor, porque não é possível por meio dele, realizar o processo de catarse (leveza e purificação). O humor brasileiro, mormente o atual, é feito de grosserias, xingamentos, de rebaixar o próximo e etc. Não traz catarse nem para quem o faz, nem para quem o assiste. Satirizam a religião, as crenças mais profundas e sagradas de uma pessoa ou povo e, não!... não é feito com o intuito de enaltecer o homem ou entrever os meandros e modismos de determinado credo, mas é feito com a única intenção de fazer rir! Rir do quê? De nada. Rir sem propósito algum. Não há catarse (leveza e purificação) nisto!
            Semelhante são os casos onde o humorista se utiliza de figuras como uma pessoa com síndrome de down, etnia ou qualquer outro traço que a identifique em sua individualidade, simplesmente para satirizar sem nenhum outro propósito que a sátira por si mesma, a audiência e a fama!
            Os humoristas contemporâneos deixaram de consultar os mais velhos, aqueles que muito tempo antes deles terem nascido, já estavam rindo e fazendo rir. Mas não sem propósito e desmedidamente como fazem os humoristas atuais. Antes, produzindo catarse em seus ouvintes. Fazendo com que eles, ao verem-se ridículos, saíssem do espetáculo mais leves e purificados daquilo que antes, lhes parecia ridículo e demérito.
Os humoristas agiam em seus palcos como verdadeiros exorcistas, expulsando demônios de si mesmos e de seus ouvintes, por meio da dramaturgia e de risos – risos estes, não sarcásticos ou maliciosos, mas risos leves e que beiravam à confraternização de todos que em coro, juntavam as vozes para rir a mesma risada/gargalhada.
            E, aos que pensam que os tempos mudaram e que o humor de antes não pode ser o humor de hoje, vale lembrar a estes, de que a todo principiante em qualquer arte, é-lhe preciso consultar os doutores, senão por respeito, ao menos pelo Princípio de Autoridade. Para fazer bom humor, é preciso consultar primeiro aqueles que foram doutores na arte do humor. Não é preciso segui-los se não quiser, mas faz-se necessário ao menos consultá-los e tomá-los como a referência primeira de uma determinada arte, no caso, a arte de fazer rir – a arte do humor.
            Doravante, o bom humor se caracteriza fundamentalmente por provocar tanto no comediante quanto na plateia, o processo de catarse (purificação e leveza). Se a comédia não faz isto, ela não é e nunca será boa comédia! Não é e nunca será bom humor! E, note-se que mesmo o chamado “humor negro” pode produzir catarse, mas é preciso que seja feito com propriedade e muito respeito pela profissão e arte humorística.




LEIA TAMBÉM:

A POÉTICA – de Aristóteles.

INICIAÇÃO À ESTÉTICA – de Ariano Suassuna.

PEQUENO TRATADO DAS GRANDES VIRTUDES (sobre o humor)   de André Comte-Sponville.